Doença do Refluxo Gastresofágico: uma doença muito comum

ESÔFAGO E ESTÔMAGO, DOENÇAS E TRATAMENTOS

A Doença do Refluxo Gastresofágico ou DRGE é o 2º diagnóstico mais comum na Gastroenterologia Ambulatorial e afeta 18 a 28% da população da América do Norte. 

O esôfago é o órgão que conecta a boca até o estômago e possui mecanismos que o protegem do retorno do conteúdo do estômago, como esfíncter esofágico inferior competente e bem funcionante, peristalse propulsiva e mecanismos de neutralização ácida. Já a DRGE é uma doença causada pela falha de 1 ou mais desses elementos protetores. 

O refluxo do conteúdo gástrico para dentro do esôfago é possível se houver relaxamento transitório do esfíncter esofágico inferior (principal mecanismo causador de DRGE), baixa pressão no esfíncter esofágico inferior e/ou hérnia de hiato por deslizamento. A distensão gástrica é o principal estímulo para o relaxamento transitório do esfíncter esofágico inferior.

A peristalse esofágica (contração do esôfago) é importante para o clareamento (limpeza) do volume refluído e para reduzir o tempo de exposição do esôfago ao conteúdo refluído do estômago. Assim, se houver anormalidades na peristalse esofágica, mais prolongado será a exposição do esôfago ao material refluído e maior tendência a esofagite. 

A neutralização do material refluído pela saliva e por secreção rica em bicarbonato (vinda das glândulas submucosas esofágicas) auxiliam como mecanismos protetores do esôfago. No entanto, pacientes com doenças que reduzam a secreção de saliva, como a Síndrome de Sjögren, tendem a ter mais esofagite devido a DRGE.

O esfíncter esofágico superior é a última linha de defesa contra o material refluído do estômago e que tenta entrar na orofaringe ou tenta promover aspiração.

Dentro do material gastroduodenal refluído há ácido, pepsina, ácidos biliares e tripsina, os quais são os fatores agressivos mais importantes. Sabe-se que o ácido gástrico associado à pepsina são mais danosos ao esôfago que o ácido gástrico de forma isolada. A intensidade da injúria esofágica na DRGE associa-se ao aumento na frequência e duração da exposição da pepsina e do material ácido refluído.

Sintomas da DRGE

Os sintomas clássicos de DRGE são pirose (azia) e regurgitação alimentar (retorno de material refluído à boca), que ocorrem geralmente após uma refeição copiosa (em grande quantidade) ou apimentada ou cítrica. No entanto, é comum os pacientes com DRGE terem outros quadros clínicos sobrepostos ao refluxo, como gastroparesia (lentidão do esvaziamento gástrico), dispepsia funcional ou desordens da motilidade digestiva.

Outros sintomas atípicos de DRGE são: dor no peito do tipo angina, asma, laringite posterior, tosse crônica, erosões dentárias e desordens do sono. Complicações potenciais da DRGE incluem estenoses (estreitamentos) do esôfago, esôfago de Barrett e adenocarcinoma esofágico.

A obesidade é o principal fator de risco para desenvolver sintomas de DRGE, esofagite erosiva, esôfago de Barrett e adenocarcinoma esofágico. Isso porque a obesidade aumenta a pressão gástrica que resulta em maior relaxamento do esfíncter esofagiano inferior.

Diagnóstico da DRGE

A pHmetria esofágica de 24 horas é o melhor exame para documentar se existe ou não a presença de DRGE e deve ser feita com o paciente sem usar os inibidores da bomba de prótons. O exame é realizado juntamente com a manometria esofágica para localização da posição do esfíncter esofágico inferior e para estudar se existe sobreposição com Desordem da Motilidade Esofágica.

A investigação do quadro deve ser feita quando os pacientes possuem sintomas ou sinais de alarme como: disfagia (dificuldade para engolir), perda de peso, anemia ferropriva (anemia por falta de ferro) ou sangramento gastrointestinal. Nestes casos a endoscopia digestiva alta (EDA) é muito útil, pois investiga a presença de esofagite erosiva e hérnia de hiato e complicações como Esôfago de Barrett, neoplasia ou úlceras. Deve-se destacar que a pHmetria esofágica de 24 horas ou a manometria esofágica não detectam essas alterações, mas a EDA sim.

Pacientes que persistem com os sintomas sugestivos de DRGE apesar do tratamento correto também devem realizar pHmetria esofágica de 24 horas. Com base nestes resultados esses pacientes serão classificados em 3 grupos:

  • Pacientes com escore anormal de refluxo ácido e pH esofágico abaixo de 4 por mais de 6% do tempo total do exame (doença do refluxo não-erosiva).
  • Pacientes com escore normal de refluxo ácido, mas com correlação positiva com o refluxo fisiológico (esôfago ácido sensível).
  • Pacientes com escore normal de refluxo ácido e nenhum sintoma correlato com o refluxo fisiológico (pirose funcional).

Pacientes destes 3 grupos possuem respostas distintas ao tratamento com inibidores da bomba de prótons, sendo os pacientes com doença do refluxo não-erosiva os que tem melhor resposta.

Nos pacientes jovens, sem sinais de alarme, o diagnóstico é clínico e pode-se iniciar o manejo terapêutico da DRGE.

Tratamento da DRGE

O tratamento farmacológico da DRGE baseia-se no uso de inibidores da bomba de prótons, os quais reduzem a secreção ácida gástrica, como omeprazol, pantoprazol, lansoprazol, rabeprazol, esomeprazol e dexlansoprazol.

Os prócineticos tem melhor resposta aos pacientes que possuem sintomas de mau esvaziamento gástrico associado.

O tratamento cirúrgico com a fundoplicatura à Nissen é uma opção, mas 10 a 20% dos pacientes podem apresentar disfagia (dificuldade para engolir), dificuldade para eructar ou vomitar após a cirurgia. Os melhores candidatos à cirurgia são aqueles que possuem DRGE confirmada por exames apropriados (especialmente se possuírem hérnia de hiato), regurgitação que não responda ao tratamento clínico e que não possuam Distúrbios da Motilidade do Esôfago associado e DRGE severa associada a aspiração, asma, pneumonia recorrente ou transplante de pulmão.

Bibliografia

  1. Mittal R., Vaezi MF. Esophageal Motility Disorders and Gastroesophageal Reflux Disease. N Engl J Med 2020;383:1961-72.

DR. JEAN TAFAREL

Hepatologia & Gastroenterologia
CRMPR: 19.809

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